sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Doze Anos: Chico Buarque

Ai, que saudades que eu tenho
Dos meus doze anos
Que saudade ingrata
Dar banda por aí
Fazendo grandes planos
E chutando lata
Trocando figurinha
Matando passarinho
Colecionando minhoca
Jogando muito botão
Rodopiando pião
Fazendo troca-troca


segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Lembranças alheias: Futebol



Meu pai torcia pelo América e, como o time já não sabia o que era primeira divisão faz tempo, as conversas de futebol, para ele, eram como passar horas conversando sobre a beleza de um lugar que ele mesmo não conhecia.
Mas, como todo mundo, de futebol ele gostava, principalmente quando era dia de jogo do flamengo. Isso porque a sede da torcida organizada do Flamengo lá do bairro ganhava ingressos do clube e trocava por um quilo de alimento que seriam repassados para instituições. As filas eram gigantescas, mas papai sempre conseguia pegar um ingresso.
Quando os ingressos acabavam e a torcida já ia desfazendo a fila, papai corria e encontrava o último e oferecia o ingresso que tinha conseguido por dois quilos de alimentos. Dois quilos e não aceitava mais que isso, achava desonesto.
Lembro de ele chegar a casa todo feliz, dizendo: 'Hoje tive 100% de lucro'. Mas até hoje acredito que o homem do fim da fila saía muito mais contente.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

OVNI - Ferreira Gullar

Sou uma coisa entre coisas
O espelho me reflete
Eu (meus
olhos)
reflito o espelho

Se me afasto um passo
o espelho me esquece
- reflete a parede
a janela aberta

Eu guardo o espelho
o espelho não me guarda
(eu guardo o espelho
a janela a parede
rosa
eu guardo a mim mesmo
refletido nele):
sou possivelmente
uma coisa onde o tempo
deu defeito

terça-feira, 20 de outubro de 2009

: Fernando Sabino

Soube um dia de um casal que estava se separando, e na hora de dividir as coisas de cada um, o marido pegou um livro meu e disse que era dele, fazia questão de levar. A mulher protestou, dizendo que era seu, ela é que havia comprado. Ele se espichou na cama, começou a ler o livro e de repente desatou a rir. Ela se ofendeu: não podia admitir que, num momento tão importante da vida dos dois, o marido tivesse coragem de ficar rindo como um idiota. Ele pediu desculpas e leu para ela o trecho. Ela também achou graça, e em pouco os dois passaram a ler juntos na cama. Acabaram na cama sem o livro… E desistiram de se separar, conforme me escreveram, contando.Reconheço que parece história inventada, como numa crônica minha.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Dormir : Fred Martins

saudade
ciúme
ferida de gume
esquecer
esquecer

Dormir
deixar o amor não ser
além de tudo que foi

Vontade
costume
vago perfume
esquecer
esquecer
esquecer
esquecer

Dormir...

http://www.fredmartins.mus.br/

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Eu Também Vou Reclamar: Raul Seixas

Eu também vou reclamar
Mas é que se agora pra fazer sucesso
Pra vender disco de protesto
Todo mundo tem que reclamar
Eu vou tirar meu pé da estrada
E vou entrar também nessa jogada
E vamos ver agora quem é que vai güentar

Porque eu fui o primeiro
E já passou tanto janeiro
Mas se todos gostam eu vou voltar

[...]

Agora eu sou apenas um latino-americano
que não tem cheiro nem sabor

E as perguntas continuam (sempre as mesmas)
Quem eu sou? De onde venho? E aonde vou, dá?
E todo mundo explica tudo
Como a luz acende
Como um avião pode voar

E ao meu lado um dicionário cheio de palavras que eu sei que nunca vou usar
[...]

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Sonho de Um Carnaval : Chico Buarque

Carnaval, desengano
Deixei a dor em casa me esperando
E brinquei e gritei e fui vestido de rei
Quarta-feira sempre desce o pano
Carnaval, desengano
Essa morena me deixou sonhando
Mão na mão, pé no chão
E hoje nem lembra não
Quarta-feira sempre desce o pano
Era uma canção, um só cordão
E uma vontade
De tomar a mão
De cada irmão pela cidade
No carnaval, esperança
Que gente longe viva na lembrança
Que gente triste possa entrar na dança
Que gente grande saiba ser criança